O bloco de oposição ao governador Romeu Zema (Novo) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) conseguiu obstruir e adiar a votação de uma proposta de emenda à Constituição que acaba com a consulta popular para a privatização da Companhia Energética (Cemig) e de Saneamento (Copasa), nesta sexta-feira (13/6). A medida está em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde deve ser apreciada na semana que vem.
O referendo foi criado ainda na gestão de Itamar Franco (1930-2011) como governador do estado na época em que já se discutia a alienação das empresas. Além de acabar com a consulta popular, a proposta do Palácio Tiradentes retira a necessidade do aval de 3/5 da Assembleia para alterar a estrutura societária das duas empresas, ou seja, 46 deputados.
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A PEC é um dos temas mais complexos do pacote de projetos de adesão ao Programa de Pleno Pagamento de Dívida dos Estados (Propag), e vista como essencial pelo governo do estado para conseguir amortizar 20% do débito com a União (R$ 165 bilhões) em ativos e conseguir zerar os juros de 4% de correção das parcelas. Contudo, a oposição afirma que o Propag tem sido usado como subterfúgio para que a gestão Zema avance no objetivo de privatizar as empresas estatais.
Durante a reunião da CCJ, os parlamentares do bloco antagonista ao governo conseguiram estender o debate por 1h30 por meio de instrumentos regimentais. O parecer pela aprovação da PEC chegou a ser lido pelo deputado Thiago Cota (PDT), mas um pedido de vistas do deputado Lucas Lasmar (Rede) adiou a votação por 24h. Com isso, o texto só volta a ser apreciado na próxima sessão do colegiado.
“A população mineira tem o direito de opinar sobre esses projetos. São duas estatais que, no ano de 2024, com lucros e dividendos, valorizaram em torno de 30% para o governo do estado, que só foca no lado financeiro. A gente vê que mesmo olhando o lado financeiro das estatais, o governo pretende vendê-las”, disse.
O parlamentar também destacou que na próxima reunião o bloco vai apresentar requerimentos e emendas para continuar com a estratégia de obstrução. “Vamos tentar o entendimento e uma negociação com o governo para mostrar que esse não é o caminho mais saudável para Minas Gerais, principalmente para as estatais”, completou.
A deputada Beatriz Cerqueira (PT) disse ainda que a oposição não pretende negociar a possibilidade de retirar alguma das estatais da proposta do fim do referendo. “Não há o que negociar. Não temos legitimidade para fazê-lo. Quando recebemos o voto e cumprimos nossa função parlamentar por quatro anos, nós não substituímos a população”, afirmou.
A petista também rebateu o argumento do tempo curto para realizar o referendo, destacando que o governo de Romeu Zema teve seis anos para fazer a consulta popular e que não fez por “saber que seria derrotado”.
“A população entende o que é privatização. Não adianta videozinho de lacração, não adianta frase bonitinha, não adianta vídeo lavando a própria louça. Isso não engana a população, ela sabe as consequências de uma privatização. Quando você privatiza, está privatizando um patrimônio que foi constituído com dinheiro público, aquilo que pertence a população. Ela tem o direito de dar a sua opinião a respeito disso”, disse.
Vice-governador
O vice-governador Mateus Simões (Novo) disse que o fim do referendo é essencial para as negociações do Propag. Segundo ele, já houve uma consulta ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) sobre a possibilidade de realizar o referendo nos prazos do Propag, mas a resposta foi de que o processo seria inviável dentro do prazo para apresentar os ativos no programa até outubro, e de adesão até 31 de dezembro.
“O TRE precisaria de no mínimo seis meses de antecedência com a lei aprovada para rodar a consulta popular, o que custaria dezenas de milhões para ser feita. Se eu apresentar a lei até outubro, mais seis meses, eu já entrei no ano que vem, mas eu tenho que fechar o acordo até dezembro. (...) Se o referendo for mantido, nós estamos dizendo que Cemig e Copasa estão condenadas a não participarem da discussão com a União e isso pode nos condenar a não chegar nos 20%”, afirmou Simões.
Para o vice de Zema e cabeça chave nas negociações do Propag, acabar com a consulta popular não é uma medida antidemocrática, uma vez que os deputados da Assembleia Legislativa são eleitos para opinarem por temas complexos. É exatamente para isso que a população elege os seus deputados, para que eles possam opinar sobre os temas de interesse da população. O referendo não foi criado para democratizar essa decisão (privatização). Ele foi criado para embaralhar a tomada dessa decisão”, disse.
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O vice-governador relacionou a manutenção do referendo com a possibilidade de substituir o parlamento por uma consulta popular. “Os deputados que estão dizendo que seria inconstitucional, ilegal retirar o referendo, deviam se perguntar se eles deviam propor o fim do parlamento. Nós podemos começar a fazer quiz no twitter, no instagram, sobre o que as pessoas acham sobre cada tema e tomar a decisão a partir disso”, ressaltou.
“Eu não estou desvalorizando a democracia. Estou dizendo que em uma sociedade complexa como a nossa, acreditar que você pode delegar para a população a tomada de decisões com a velocidade que elas precisam ser tomadas, e com a complexidade dos sistema, é desconfiar do papel do legislativo”, completou.